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Carta ao meu Super Herói.

Quarta 07/02/2018 - Aislan Henrique
Fonte: Lizandro Júnior
Carta ao meu Super Herói.

Carta ao meu Super Herói.

Hoje a dor resolveu apertar o meu coração de uma forma que eu nunca imaginei um dia sentir. O tempo fechou, o riso já não quis mais aparecer no rosto e a tristeza tomou conta da rua Farnese Maciel. Todos os dias que eu passava ali naquela esquina, lá estava ele. De prontidão, com os braços apoiados na grade, levantando a mão e me dando tchau. Todos os dias eu passava ali na porta e estava lá o senhor Borongo, meu avô, cumprimentando todos os pedestres, pessoas nos carros e visitantes que por ali passavam. Todos o conheciam!

Há cerca de quatro meses, eu resolvi diminuir meu ritmo. Mudei de trabalho, resolvi me dedicar inteiramente à fotografia. Mas o que muitos não sabem é que de tanto passar ali na porta, um dia Deus falou comigo: Pare. Aproveite seu avô! Passeie com ele. Só que na minha cabeça, eu jamais imaginei que era pra ser tão rápido. Assim o fiz. Deixei meu emprego, foquei na fotografia e dediquei boa parte do meu tempo a visitá-lo e convidá-lo para passearmos. A resposta era certeira: Vamos passear Vô? “Vamo! Dá tempo de calçar as botinas?” E passeamos muito. Visitamos as cidades que ele viveu, os lugares que ele gostava aqui na cidade. Eu sempre perguntava onde iríamos, e por último, ele me respondia: “Pode ser lá no alto da cidade mesmo. Lugar bonito aquele viu. “ E ficávamos lá observando toda a cidade, e como tudo tinha crescido. Em nosso último passeio lá, minha esposa fez uma foto nossa de costas, a qual jamais me esquecerei. No dia, essa foto não teve o valor que ela tem hoje. Ah, parecia que ele olhava para o futuro e via os tempos difíceis que viriam...

Hoje eu enxergo o que eu não queria ver. Ele era pra mim o meu super herói. Jamais pensei que um dia ele fosse partir! Ele era tão forte! Tão engraçado, tão gentil com todo mundo. A morte era algo que não poderia passar pela nossa cabeça. O vô era eterno. Ele sempre me visitava na loja onde eu trabalhava, tanto que até meu patrão já falava com ele pra ir lá me ver. Às vezes, era só um Xerox para minha mãe, mas ele aproveitava esse momento para me surpreender com uma bala chita na mão.

Ê borongo! Hoje eu choro aqui de tristeza em saber que não vamos mais passear juntos em Santana. E saber que o senhor não estará lá quando eu passar de novo. O morro da Farnese Maciel era grande, mas a força que te movia era muito maior. Andava pra todo lado, visitava todo mundo, fazia questão de ser útil sempre. De uns meses pra cá, o morro ficou maior, as pernas já não respondiam tão bem, o “fôlego” faltava. Passou a ficar só lá na grade, olhando a vida passar, cumprimentando Deus e o mundo. Ele e o pingo, meu cachorrinho ficavam ali por horas, todos os dias. No começo, ele não gostava muito de cachorro. Depois, o Pingo se tornou seu “cumpanheirim” como dizia ele. Estava atrás dele onde fosse. Ficava lá na grade, juntinho com ele. Não saía de perto. Deitava ao lado da sua cama, como se vigiasse.

Aos pouquinhos, a distância entre o sofá e a grade foi aumentando, e o senhor praticamente só andava até o sofá. De lá, onde tem as marcas do seu chinelinho, olhava os carros subindo e descendo o dia todo... Já nos últimos dias, a cama parecia tão gostosa né? Chegava lá, estava dormindo. Voltava, estava dormindo. Vô, o senhor está bem? “Tô Junior. Tô só descansando aqui, acabei de armuçá.” Voltava lá de novo, estava ele deitado. Um dia, convidei ele pra sairmos. E a resposta me assustou demais. “Oh, Junior, me fala isso não. É o trem que eu mais gosto de fazer e eu não consigo mais.” O sinal de alerta acendeu na hora. Algo realmente não estava bem com ele. Tratei de levá-lo ao hospital logo, e me recordo direitinho, foram mais de 60 minutos até que conseguimos entrar no carro. Meu coração não queria acreditar, aliás, não passava pela minha cabeça que ali era o inicio do fim. Quando ele entrou no carro, já veio logo falando: “Ê Junior, eu gosto é do barulho desse carro” Ah que dor que é andar nele agora vô. O senhor não sabe como dói. Ouvir o barulho desse carro aqui e saber que o senhor não vai andar mais comigo nele.

Já no hospital, dormi com ele uma noite. Pensa num homem que gostava de comer. Levantou às 03h da manhã pra comer rosca. E ainda me ofereceu. “Tama, tem duas rosca, uma pra mim e a outra é pro cê” E se satisfez. Olhávamos sua melhora e estávamos animados. Ansiosos pra ele voltar pra casa. E ali, eu percebi que a minha felicidade era aquele vô. Gente do céu, ele era um esteio, meu ponto maior de apoio. Senti como se estivessem querendo cortar um grande tronco que sustentava o mundo inteiro sabe. Ver ele ali no hospital me fazia ter a certeza de que ele iria melhorar. E melhorou muito. Infelizmente, foi preciso ir para o CTI para tratar uma pneumonia. Ê CTI ruim aquele. Nossa, me dói demais lembrar do rostinho dele olhando pra mim. Quase como pedindo socorro. E esse foi praticamente seu último pedido pra mim. “Junio, me ajuda fi. Tô com falta de ar” Mesmo com o oxigênio ligado...

Ví ali toda minha infância sendo despedaçada, e compreendi ali que a morte já não era tão ruim assim. Ver meu super herói naquela situação fazia a morte parecer um luxo. E no seu último dia, comprei a rosquinha que ele gostava, ele comeu, jantou muito e passou a noite toda batendo papo com a Juliana. No outro dia cedo, quando minha mãe me disse que o senhor não estava bem, toda aquela esperança de melhora foi embora. Pensei comigo mesmo que já não havia o que fazer. A tristeza em te ver assim me destruía por dentro. E o senhor descansou vô. Contou todos os casos que tinha no mundo, me ensinou todos os valores que eu tenho hoje. Passeou comigo quando eu era pequeno, me pegou no colo várias vezes pra me luxar. Lembro dos beijinhos no rosto, aqueles estralados sabe? Que ele me dava com aquele bigode me fazendo cócegas no rosto. Sentadinho naquela fornalha, nos aquecíamos juntinhos. Santana era o meu paraíso. Onde o senhor me ensinou tudo, os bons modos, a educação e tudo o que sei praticamente.

Hoje eu me sinto derrubado, completamente vencido pela dor de não poder mais te ver, vô. A saudade parece que vai embora e volta mais forte. A pancada foi forte demais. Me lembro que o senhor pegava sua camerazinha de filme e tirava foto de todo mundo. Cortava cabeça, pé, mas sempre estava lá querendo tirar um retrato de todo mundo. Revelava tudo, mesmo quando ninguém mais fazia. Chegava lá em casa com aquele tanto de foto. E hoje, vendo todas as fotos, eu vejo que o importante são as lembranças que temos de todos esses momentos. Tirei todas as fotos possíveis do senhor, vô. Fizemos alguns vídeos, viajamos juntos. Mas a minha vontade era só de ter mais uns meses contigo, para podermos voltar lá na Catiara, visitar a tia nenzinha para que o senhor pudesse conversar pela ultima vez com o tio Geraldo e relembrar juntos as coisas que fizeram juntos... Passear no “pasto grande” e visitar a árvore que o senhor escreveu seu nome nela. Ir à serra só pra o senhor ver a tia Shirlei e a Carla. Passear no tio Célio, nossa quanto o senhor gostava de lá né?

Mas hoje, mesmo com toda essa tristeza no coração, eu digo obrigado Deus! Porque tive o privilégio de conviver com o meu avô por tanto tempo. E o privilégio maior! Que ELE conhecesse meu filho. Isso eu jamais poderei agradecer. Deus, eu peço a ti que cuide desse velhinho ai. Sei que está bem cuidado, mas peço uma atenção especial a esse que foi o meu verdadeiro PAI. Cuida dele e da minha vozinha querida que está com ele ai também. Ficaram separados esses anos, mas junta eles ai de novo. Eles têm muita coisa pra conversar e matar a saudade. É possível, Deus?

Ah, manda um recadinho pra ele pra mim? Sei que o Senhor não falha, então sei que esse recado vai chegar nele. Então, olha, fala pra ele assim: “O Junior mandou te dizer que é pra esperar ele aqui. E que quando chegar, ele quer que o senhor conte pra ele todas as histórias aqui do céu. Ele quer que o senhor fala pra ele o quão grande e bonito aqui em cima é. E disse que quando chegar aqui, vai passear muito com você. Calça as botina que ele vem pra passear junto com o senhor, o Luis e a Vó. E é você que vai na frente, pra contar todos os causos aqui do céu”.

Obrigado, Deus, por me permitir ter uma pessoa tão boa e especial como o meu avô foi. Obrigado. Palavras não conseguem expressar essa minha gratidão, apesar do meu coração estar destruído. O Senhor sabe da minha gratidão pela vida dele. Cuida dele pra mim. Te amo.


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